5º DOMINGO DA PÁSCOA
29 de abril – Ano B
Evangelho
Jo 15,1-8
Jesus é a videira e nós somos os ramos. Quem não
permanecerá ligado a Ele, irá murchar, secar, e será lançado fora. Continuar lendo
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O ideal da
comunidade cristã
Desde os primeiros tempos do
cristianismo compreendeu-se que a vida cristã supõe a pertença a uma
comunidade. Aliás, se a Igreja é a grande comunidade dos crentes, a que o Concílio
Vaticano II ousou chamar Povo de Deus, e a que todos os cristãos pertencem,
cada um tem no entanto de ter a sua pequena comunidade onde se realiza
plenamente como cristão. Era assim a comunidade de Jerusalém onde todos estavam
unidos «na doutrina dos Apóstolos, na fração do pão, nas orações e até mesmo na
partilha dos bens» (cf. At. 2,42-47). A liturgia deste V Domingo da Páscoa
sugere-nos esta pertença à comunidade. É Paulo que sente a necessidade de sair
de Damasco e se unir à comunidade de Jerusalém onde, pela sua história, não era
fácil viver. É João que na sua primeira carta marca a atitude fundamental na
comunidade cristã, acreditar em Jesus Cristo Ressuscitado e amar os irmãos como
Ele nos amou” (cf. 1Jo 3,2) Finalmente para ter um modelo de comunidade foi o
próprio Jesus que nos deu a alegoria da videira: todos os cristãos unidos a
Ele, a cepa, e todos unidos uns aos outros na caridade.
1. A experiência comunitária de Paulo
A vida de Paulo em Damasco não foi
fácil. Era receado pelos convertidos a Jesus Cristo e era condenado pelos
judeus que viviam na cidade. Acabou por ter de fugir, passando dentro de um
cesto as muralhas do velho burgo. A sua referência foi a comunidade de
Jerusalém. Apresentado por Barnabé, foi acolhido por todos os crentes. No
entanto alguns temeram que ele fosse apenas um judeu introduzido para controlar
a vida da comunidade. Por outro lado, os judeus, fiéis ao Sinédrio,
consideravam-no um traidor. Na aparência era duplamente mal amado. Os líderes
da comunidade acompanharam-no, então, até Cesareia de Filipe e depois a Tarso,
sua terra natal. Em cada um destes lugares havia já pequenas comunidades
cristãs que o trataram como irmão. Talvez tenha sido por esta sua experiência
que ele, apóstolo dos gentios, se tornou fundador de comunidades cristãs. De
Antioquia a Roma foram muitas as comunidades fundadas por Paulo. Os seus longos
caminhos através do mundo conhecido outra coisa não foram do que a consagração
de um líder que, ao anunciar Jesus Cristo, revelava que não era possível ser
cristão, sem estar numa comunidade viva e evangelizadora.
2. A lei fundamental de uma comunidade
cristã
Jesus Cristo anunciara um mandamento
novo “que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 13, 34). É preciso
levar à prática esta lei do amor. Não há lugar melhor para fazê-lo do que uma
comunidade cristã. É com a mesma dinâmica do amor que se ama a Deus e aos
irmãos. A relação com Deus estabelece linhas de confiança que são profundamente
pacificantes. É certo que a prática dos mandamentos é sinal de uma profunda
relação com Deus. Porém, o primeiro dos mandamentos é o amor aos irmãos. Por
isso, João na sua carta, aconselha os membros das comunidades a acreditarem em
Jesus Cristo e a amarem-se uns aos outros.
3. A alegoria da videira
Esta é uma das páginas mais belas do
Evangelho. Jesus, num misto de exigência e de poesia quis dizer “eu sou a
videira vós os ramos” (Jo 15,5). Numa descrição simples, Jesus estabelece a
relação de pertença ao dizer que é preciso estar unido à videira, permanecer
n’Ele, viver d’Ele, estar em comunhão com Ele. Por outro lado, os discípulos
estão em comunhão uns com os outros numa caridade verdadeira. Esta dupla
relação com Cristo e com os irmãos é condição para dar fruto para que esse
fruto permaneça. A comunidade cristã não se fecha sobre si própria, alimenta-se
de Cristo, celebra o amor fraterno e dá fruto em abundância para que todos
tenham vida.
monsenhor Vitor
Feytor Pinto “Revista de liturgia diária”
Neste domingo a Palavra de Deus nos
apresenta a imagem do pé de uva (a videira) mostrando que a condição óbvia para
que o ramo dê fruto é que permaneça unido ao seu tronco. De forma semelhante,
quem permanecer unido a Cristo dará frutos (evangelho). Quem faz a vontade do
Pai, com fé e amor, está unido a Cristo (2ª leitura). Paulo, unido a Cristo,
deu testemunho de sua fé ajudando a construir e propagar a Igreja primitiva (1ª
leitura) com a graça do Espírito Santo.
1ª leitura: Atos dos
Apóstolos 9,26-31
O motivo pelo qual Paulo foi a
Jerusalém não era outro do que encontrar-se com Pedro a fim de confirmar sua
doutrina e fé no Evangelho. Paulo compreendia que não devia evangelizar
paralelamente, mas em comunhão com Pedro, representante vivo de Jesus Cristo e
referência da doutrina e da veracidade do Evangelho na terra pois a verdadeira
evangelização só pode acontecer em comunhão com a Igreja, estabelecida por
Jesus no fundamento dos Apóstolos, que é Pedro.
Mas, para os cristãos de Jerusalém,
Paulo não era mais do que um rabino fariseu, recém convertido, com um triste
passado de perseguição à Igreja. Foi preciso que alguém lhe abrisse o caminho
para ser aceito sem receio pela comunidade cristã e, mais tarde, se tornasse o
maior apóstolo de Cristo. Esse “alguém” foi José, um levita da ilha de Chipre,
cujo nome fora trocado pelos Apóstolos pelo de Barnabé (que significa “filho da
consolação”). Foi um dos primeiros a colocar seus bens em comum na comunidade
de Jerusalém (Atos 4,36-37) e o missionário enviado pela comunidade de
Antioquia, que tirou Paulo do anonimato de Tarso e o convidou a acompanhá-lo em
sua viagem apostólica.
A desconfiança da comunidade a respeito
de Paulo era compreensível pelo mal que tinha feito anteriormente, perseguindo
à Igreja. Por isso foi necessário que alguém respeitado pela comunidade
apresentasse argumentos convincentes a favor dele (“lhes contou como Saulo no
caminho tinha visto o Senhor, como o Senhor lhe havia falado, e como ele havia
pregado corajosamente em nome de Jesus na cidade de Damasco”). Só assim a
comunidade acolheu e confiou em Paulo.
Isto mostra como a graça de Deus usa de
intermediários humanos para dar seu fruto e como a comunidade cristã tem de ser
acolhedora, estando sempre disposta, aberta e sem preconceitos ao acolhimento
de todas as pessoas, porque a graça de Deus acontece onde menos se espera.
2ª leitura: 1ª João
3,18-24
O apóstolo João, já idoso, se dirige
aos cristãos com carinho paternal, chamando-os de “filhinhos”, e transmite toda
a sua sabedoria, simples e muito prática, acumulada ao longo da vida.
É o Espírito Santo, que gera em nós a
fé em Jesus, e nos manifesta que Ele é o “Deus conosco” (“graças ao Espírito
que ele nos deu, reconhecemos que Deus está conosco”). Esta fé não vive de
aparências, mas se concretiza pela prática do mandamento do amor, procurando o
modo de promover a vida e o bem dos irmãos.
O Evangelho não nos pede que sejamos
perfeitos, primeiro, para depois amar. “Mesmo que a nossa consciência nos
condene”, o bem que praticamos tem valor em si mesmo “porque Deus é maior do
que a nossa consciência, e ele conhece todas as coisas”, compreende e perdoa as
nossas imperfeições.
Se a fé em Jesus nos leva a cumprir o
mandamento do amor, sabemos que estamos com Deus e Deus está conosco.
Evangelho: João
15,1-8
Novamente Jesus fala aos discípulos
usando símbolos para que eles possam compreender melhor. A videira, da qual se
colhe a uva e, com a uva, se produz o vinho, é muito apreciada e faz parte da
vegetação e cultura do povo na Palestina. Foi usada pelos profetas para
simbolizar como Deus espera “frutos” de seu Povo.
Só Jesus é a “verdadeira videira” que,
com sua fidelidade, nunca defrauda o “agricultor” que é o Pai. Vivenciando a
graça do batismo, que nos une a Cristo, poderemos agradar a Deus porque “quem
fica unido a mim, e eu a ele, dará muito fruto”.
Participar da comunidade cristã não é
fazer parte da Igreja apenas como instituição, mas aderir à pessoa de Jesus e
estar unidos a Ele. Se permanecermos unidos a Jesus, os frutos que daremos
serão os mesmos frutos d'Ele e poderemos testemunhá-lo levando a comunidade a
uma contínua expansão e crescimento pois Ele é que transmite essa fecundidade (
“porque sem mim vocês não podem fazer nada”).
O ramo que não dá fruto é porque não
está unido a Cristo. É cortado fora. O ramo que dá fruto é podado para que,
através da provação, tenha a oportunidade de afirmar sua fidelidade e se
fortalecer para dar mais fruto ainda.
Palavra de Deus na
vida
O evangelho de hoje, e do próximo
Domingo, faz parte do “discurso de despedida” de Jesus na última ceia, quando
Ele abre seus lábios e seu coração para partilhar confidências com os
discípulos. É como seu testamento espiritual.
Na imagem que Ele usa, a videira e os
ramos formam um todo. A união é vital, íntima e completa... mas a seiva, o
Espírito, a vida, não brota dos ramos; eles a recebem do tronco, da videira. De
Jesus procede a seiva que dá energia ao cristão. Ele é quem dá a coragem de
viver. A verdadeira vida de Deus passa por Ele e os ramos só terão vida na
medida em que estiverem unidos ao tronco.
Isto significa que a vida cristã não
nasce por geração espontânea. Precisamos estar unidos a Cristo pela oração,
pelo acolhimento de sua Palavra, pela prática do bem e da justiça, para não
secar por falta de seiva e deixar de produzir frutos.
De que frutos se trata?
As expressões que mais repete Jesus
são: “permanecer” e “dar frutos”. Os frutos bons, que dão glória ao Pai, são os
que procedem do Espírito de Jesus tais como não buscar ser servido mas servir,
estar prontos para ajudar os necessitados, compadecer-se sempre, preocupar-se
com os outros, estar disposto a curar qualquer tipo de ferida, aliviar toda
espécie de dor, servir, acompanhar, alegrar a vida das pessoas... São os frutos
das boas obras próprias do verdadeiro discípulo de Cristo que permanece unido a
Ele e aceita que Ele esteja presente e sua vida.
Esta permanência e entrosamento mútuos
é a chave de seu seguimento. Indica um tipo especial de relação entre dois
seres pessoais. Quem tem o Espírito de Jesus esta inserido n'Ele, é ramo verde,
está vivo. A vitalidade do discípulo de Cristo, nasce d'Ele. Daí a comparação
com a união que existe entre a videira e seus ramos. O cristão se une a Cristo e,
através de Cristo, a todos os cristãos.
O discípulo está chamado não apenas a
dar frutos mas a dar muitos frutos (“A glória de meu Pai se manifesta quando
vocês dão muitos frutos”). Ao aceitar a mensagem de Jesus já há uma limpeza
inicial (“Vocês já estão limpos por causa da palavra que eu lhes falei”), mas,
às vezes, é necessária uma operação de limpeza completa porque a videira só dá
boa colheita se for podada.
Jesus nos diz que Ele é a videira,
incluindo também os ramos e o fruto. A poda é a atividade própria do Pai, que é
o agricultor. Ele planta, cultiva, limpa e cuida com esmero de cada um de nós
para cortar tudo aquilo que atrapalha o surgimento da vida nova e a ação do
Espírito do Pai e do Filho em nós. Corta nossos brotos de orgulho, de egoísmo, de
acomodação de falta de solidariedade... que nos impedem de dar “muito” fruto.
Ele sabe o que nos convém e quando nos convém. Mesmo dolorosa, a poda é sempre
conveniente, necessária e positiva em nossa vida.
É a prova de que Deus espera muito de
nós. Contamos com a sua confiança. Não o decepcionemos.
Pensando bem...
Lembrando da primeira leitura, podemos
dizer que a Igreja precisa sempre de “barnabés” que acolham as pessoas com um
voto de confiança e saibam aproveitar todo o potencial dos que se aproximam da
comunidade cristã. Alguma vez nós mesmos já tomamos a atitude de Barnabé?
Que frutos podem esperar os outros de mim? O segredo consiste em permanecer em Jesus, escutar e viver sua Palavra.
Que frutos podem esperar os outros de mim? O segredo consiste em permanecer em Jesus, escutar e viver sua Palavra.
A poda (El. Ulibarri)
Poda-nos o Pai, é o que Tu dizes.
Poda àqueles que dão fruto, para que
deem ainda mais.
Podam-nos os amigos, o grupo, a
comunidade,
por meio de relações sinceras e
fraternas;
a través da ajuda, da crítica
construtiva e da experiência.
Podam-nos quando balançam nosso estilo
de vida e escala de valores;
Quando nos obrigam a enfrentar as
incoerências e as zonas escuras de nosso ser.
Alguns se podam a si mesmos para dar
mais fruto.
Sabem dizer não a certas coisas.
A maioria das podas acontecem, porém,
sem buscá-las.
São trazidas pela vida quando menos se
espera;
são podas involuntárias, imprevisíveis,
às vezes duras e dolorosas,
e nem sempre as aceitamos como algo
positivo.
Involuntária ou voluntária, a tempo ou
fora de tempo,
assumida ou rejeitada, a poda é o
segredo das pessoas que se tornaram fortes, dos homens e mulheres que dão
fruto, daqueles que têm vida.
Poda-nos, Senhor! Poda-me, Senhor!
padre Ciriaco
Madrigal
"Eu Sou a
videira e vós os ramos"
Celebramos hoje o domingo da videira e
dos ramos. Chegamos à quinta semana da Páscoa, portanto, na alegria e na
esperança, já vivenciamos a primeira metade do Tempo Pascal e dele colhemos os
frutos da ressurreição.
Jesus Cristo ressuscitado apresenta-se
como videira e revela o Pai como agricultor. Ele nos convoca a uma relação de
intimidade comparada à dos ramos com o tronco da árvore.
Celebramos a Páscoa de Jesus que se
revela como videira e se manifesta em todas as pessoas e grupos que testemunham
um amor concreto, para além dos preconceitos e discriminações.
Primeira leitura:
Atos 9,26-31
Quanto a primeira leitura de hoje, é
bom recordar seu contexto, o capítulo 9 dos Atos dos Apóstolos. Os versículos 1
a 9 descrevem a conversão de Paulo, a "caminho de Damasco". Nos
versículos 10 a 19, podemos ver seu encontro com a comunidade de Damasco e seu
trabalho pastoral junto a essa comunidade (vs. 19-25).
No capítulo 9 dos Atos dos Apóstolos
pode-se chegar á conclusão de que Paulo tenha sido vítima das situações que
determinaram suas idas e vindas. Ele fugiu de Damasco para escapar das mãos dos
judeus. Ao voltar a Jerusalém, de onde ele saiu como perseguidor, Paulo é
recebido com muita reserva, porque desconfiam da sua conversão (v. 26). Por
meio de Barnabé que lhe serve de intermediário ou "advogado" (cf.
Atos 4,36), ele ganha a cobertura dos apóstolos. Pregando em Jerusalém Paulo
tentou reatar o diálogo com os helenistas, ou seja, com os judeus da diáspora
cuja língua era o grego, interrompido pelo martírio de Estevão, em que o próprio
Paulo desempenhou um papel de cúmplice (cf. Atos 7,58-81). Mas quando
constataram que Paulo correu o mesmo risco, os irmãos o levaram para a Cesaréia
e o encaminharam para Tarso.
Em nossas comunidades, muitas vezes
também encontramos tais atitudes: medo, desconfiança, preconceito, fechamento.
Diante da firmeza com que Paulo pregava o nome do Senhor, a própria comunidade
foi dando-se conta de que, de fato, ainda não estava convertida. Foi preciso
que alguém de fora a provocasse e desse testemunho, para que ela percebesse
isto.
O versículo 31, versículo final, é um
breve resumo da vida da Igreja: é o Espírito santo que conduz a Igreja na sua
caminhada pela história. É este mesmo Espírito que aguardamos na festa de
Pentecostes que se aproxima.
Conforme Atos 22,17-21 não foram as
situações que levaram Paulo a sair de Jerusalém e de Judá, da terra dos judeus.
Pelo contrário! Paulo as explicou para permanecer aí e pregar aos judeus na
própria capital espiritual deles (vs. 19-20). A sua saída de Jerusalém é
conseqüência de uma intervenção do Senhor que, em uma visão no templo, lhe
comunicou a sua verdadeira missão através destas palavras: "Vai, porque é
para os gentios, para longe, que quero enviar-te" (Atos 22,21).
Segundo Gálatas 1,18-23 toda a
iniciativa teria vindo de Paulo. Fazia três anos que ele pregava o Evangelho
aos pagãos, procurou Pedro em Jerusalém. "Fiquei com ele quinze dias... Em
seguida fui para as regiões da Síria e da Cilícia (Gálatas 1,18b.21). Neste
contexto a estadia de quinze dias em Jerusalém apresenta-se somente como
intervalo, uma espécie de visita "ad limina". Isto sugere que
a breve estadia de Paulo em Jerusalém junto aos apóstolos na igreja-mãe marcou
um ponto decisivo na sua missão de apóstolo dos pagãos.
Para o apóstolo Paulo, a
evangelização se realiza ao mesmo tempo em dois ambientes juntos: o mundo
judeu, evangelizado por Pedro, e o mundo pagão, do qual se julga responsável
(Gálatas 2,9) ao ponto de descuidar toda a referência a Jerusalém. São Lucas
reage contra esta concepção que causa divisão na evangelização, insistindo na
unidade do movimento missionário, que teve origem em Jerusalém, e estendendo-se
até os confins das nações (Atos 1,8). Daí a tendência de aproximação das duas
figuras de Pedro e de Paulo (comparar Atos 15,1-12 e Gálatas 2,11-14). Lucas
liga a ação missionária de Paulo à comunidade de Jerusalém (Atos 9,26-31),
enquanto que Paulo diminui seus contatos com Jerusalém (Gálatas 1,18-19).
Lucas defende, assim, a unidade
organizadora da missão na Igreja, que a especialização das funções e a
repartição de influência não pode colocar em questão.
A preocupação com a unidade da missão a
partir da Igreja-mãe de Jerusalém não cega, contudo, São Lucas. Ele está
consciente das imperfeições desta igreja e se for necessário que toda a missão
venha dela para garantir sua unidade (um pouco como "era preciso" que
Jesus subisse a Jerusalém: Lucas 9,51), este privilégio não esconde suas
deficiências.
A vontade de Lucas, de fazer a partir
de Jerusalém toda a missão da Igreja, não é somente a expressão de sua
preocupação em ver cumpridas as profecias anunciando a salvação das nações em
Jerusalém (Isaias 60; Zacarias 14), nem um meio fácil de organizar os capítulos
do seu livro em círculos concentrados a partir da cidade, mas uma preocupação
doutrinal: a afirmação da única missão, simbolizada pela cidade de Jerusalém
(cf. Salmo 121/122; Salmo 47/48; Lucas 24,47-49)
Salmo responsorial:
21,22, 26-28.30-32
O salmo 21/22 revela um grande e
terrível conflito entro o justo e os injustos, mostrando que surgiu uma
sociedade desigual, conflitiva e violenta (talvez se trate de conflito no
campo)
Este salmo se refere ao festim
messiânico. No versículo 27 o salmista anuncia que os que louvam o Senhor e
procura o Senhor, terá vida longa e feliz. Seria afirmar nessas palavras: que o
vosso coração viva para sempre! São votos de boa saúde, dirigidos a quem
participava de uma refeição sacrifical (cf. Salmo 69/68,33.
O rosto de Deus no Salmo 21/22. Há uma
relação íntima e pessoal entre o justo e Deus, a ponto de chamá-lo de "meu
Deus". Por causa desse Deus da Aliança é que essa pessoa tem a coragem e a
confiança de clamar. A imagem mais bela de Deus neste Salmo é, portanto, a do
Deus que ouve o clamor do pobre injustiçado e o liberta, fazendo-o cantar hinos
de louvor (vs. 23-27).
De acordo com Marcos 15,34 e Mateus
27,46, Jesus rezou a primeira parte deste Salmo na Cruz que está na liturgia do
Domingo de Ramos. Ele, portanto, é o justo inocente que clama confiante. E Deus
lhe responde com a ressurreição. Mas é oportuno prestar atenção também em todos
os clamores que Jesus ouviu e atendeu ao longo da vida. Ele é, portanto, a
resposta do Deus que ouve os clamores e liberta.
Como resposta à Palavra de infinito
amor de nosso Deus, cantamos, pelo Salmo 21/22, um hino de ação de graças e de
adoração ao Senhor nosso Deus. Cantando este Salmo em nossas celebrações,
agradeçamos ao Senhor Deus que jamais abandona quem nele põe a sua confiança.
Peçamos que nos sustente em nossa luta de cada dia por uma história nova,
alicerçada na justiça e na paz.
Segunda leitura: 1
João 3,18-24
Na segunda leitura de hoje, o Apóstolo
João acentua que recebemos do Senhor este grande mandamento: "Que amemos
uns aos outros". Ele afirma que "permanecer em Deus" significa
guardar seus mandamentos, todos eles contidos no grande mandamento do amor.
João afirma, ainda, que, pelo Espírito Santo, sabemos que Deus permanece em
nós. O mesmo Espírito quem segundo informa o livro dos Atos dos Apóstolos,
ajudava (e ajuda) a Igreja de Cristo a crescer.
O ambiente do texto é de afeto, isto é,
um diminutivo afetuoso quando diz Filhinhos. João afirma que o seguidor de
Jesus deve ter compaixão, como Ele teve (Hebreus 2,16 ss.; 4,15; 5,2; Efésios
4,32; 1 Pedro 3,8). Não é cristão um coração insensível. O amor é sinal da
presença ativa do amor de Deus nos cristãos. Não bastam palavras, é preciso
amar de maneira concreta (v. 18; cf. Tiago 2,15s; mas com ações e de verdade.
Como diz um provérbio popular: obras são amores e não boas razões. A
sinceridade do amor se prova com atos.
Amar de verdade é amar como Jesus amou
na cruz (1 João 3,16): este é o critério! Toda a obra, que se fizer em favor
dos irmãos, merece ser feita com o amor que Jesus teve na cruz. O Senhor e o
discípulo são uma coisa só: conhecer de verdade (v. 19), paz e tranqüilidade de
consciência (v. 20), confiança em Deus (v. 21), eficácia de oração (v. 22),
amor e fé (v. 23), comunhão com Deus atestada pelo Espírito Santo (v. 24).
Somente a prática da caridade revela se
somos "da verdade", isto é, filhos de Deus (v. 19), que se exerce a
caridade sem hipocrisia (1 Pedro 1,22; Romanos 12,9; 2 Coríntios 6,6). Por
"verdade", aqui, compreende-se a verdade divina que mora no cristão
(1 João 1,8; 2,4).
Se não somos de Deus, não haverá amor
verdadeiro. Se houver, ao invés, amor sem hipocrisia, é porque estamos em
comunhão com Deus. O cristão, que assim age, está no caminho reto, pode ficar
tranqüilo, estar em paz, porque, mesmo que a consciência acuse algo, Deus é
maior.
Para o apóstolo João, o que é mais
fundamental e agradável a Deus é a fé em Jesus Cristo, aliada com a caridade
fraterna. Essa fé não é só somente uma ligação intelectual, não é só receptiva,
mas viva e plena, que se concretiza no amor fraterno, na conduta moral como
obediência absoluta e sem limites aos preceitos divinos.
O apóstolo João lembra em primeiro lugar
um princípio que lhe é caro: assim como não podemos contentar com um
conhecimento abstrato de Deus, assim também não podemos amar nossos irmãos e
irmãs somente com palavras (versículo 18).
O mandamento que nos dá segurança
diante de Deus e que garante sua permanência entre nós é duplo: crer no nome de
Jesus Cristo e amar uns aos outros (v. 23). João apresenta estes dois aspectos
de tal maneira que parecem constituir apenas um. Com efeito, julga que não há
duas virtudes separadas uma da outra: de um lado, a fé, do outro, a caridade;
elas são as dimensões vertical e horizontal, mas ao mesmo tempo, de uma única
atitude (cf. João 13,34-46; 15,12-17). Somos filhos de Deus por nossa fé, e a
caridade fraterna nasce desta filiação (1 João 2,3-11).
Não é fácil conservarmos ao mesmo tempo
a dimensão horizontal e a dimensão vertical do mandamento de Deus. Hoje,
particularmente, o cristão tenta procurar um amor fraterno mais verdadeiro e
universal, mas sem referência a Deus, esquecendo-se de que o amor mergulha suas
raízes na própria vida de Deus.
Crer em Jesus Cristo, como pede o
apóstolo João, é crer que o Pai ama todas as pessoas através de seu próprio
Filho, é querer participar desta mediação de amor, é, ainda, admitir que Jesus
respondeu de maneira única ao amor do Pai e querer imitar sua renúncia e sua
obediência de filhos.
A Eucaristia relaciona os cristãos ao
mesmo tempo com Deus e com as pessoas. Ela não os reúne para que, em primeiro
lugar, rendam graças a Deus e, em seguida, voltem-se para os outros: a ação das
duas atitudes juntas constitui sua própria essência.
Evangelho: João
15,1-8
Em João 15,1-8 e 15,9-17 (5º e 6º
domingo da Páscoa Ano B) formam um conjunto: a alegoria da vinha e dos ramos.
O Evangelho deste domingo da Páscoa
situa-nos em Jerusalém, numa noite de quinta-feira, um dia antes da festa da
Páscoa. Jesus está reunido com os seus discípulos à volta de uma mesa, numa
ceia de despedida. Ele está consciente de que os dirigentes judaicos decidiram
dar-lhe a morte e que a cruz está no seu horizonte próximo.
Os gestos e as palavras de Jesus, neste
contexto, representam as suas últimas indicações, o seu "testamento".
Os discípulos recebem, aqui, as orientações para poderem continuar, no mundo, a
missão de Jesus.
Assim, temos a belíssima comparação de
Cristo como videira e de seus discípulos, que somos nós, como seus ramos. O
texto mostra que afastado da videira, o ramo seca e só serve para ser queimado,
isto é, não pode mais contribuir para a vida. O ramo afastado seca porque ele
não recebe mais a seiva para alimentá-lo, fortalecê-lo. A seiva é a vida da
videira, como Cristo é nossa vida. Afastados Dele, secaremos, não serviremos
mais para o florescimento do Reino de Deus.
"Eu sou a videira
verdadeira", é uma das fórmulas Eu sou + imagem que ocorre, no Evangelho
de João (cf. João 6,35: "Eu sou o pão da vida"; 8,12"Eu sou a
luz do mundo; 10,7: "Eu sou a porta das ovelhas; 10,11: "Eu sou o bom
pastor"; 11,25: "Eu sou a ressurreição e a vida"; 14,6:
("Eu sou o caminho, a verdade e a vida"). Pode ser invocações
litúrgicas da Igreja do evangelista João, comentadas nos discursos de revelação
de Jesus. A semelhança de João 15 com o a simbologia do pastor e do rebanho, em
João 10, é clara.
O Evangelho desse domingo faz parte do
segundo discurso após a Ceia com seus discípulos. Cristo insiste na força das
uniões que se estabelece entre Ele e os cristãos de todos os tempos, (João
15,4.6.7.10) e que serão reforçados pelo envio do Espírito Santo (João
16,7.13). Emprega, para isso a alegoria da vinha.
A vinha simboliza tradicionalmente a
Terra Prometida (Números 13,23), mas principalmente o Povo eleito, vinha que
produzia, aliás, mais freqüentemente uvas azedas que vinho (Oséias 10,1; Isaias
5,1-7; Jeremias 2,21; 5,10; 12,10-11; Ezequiel 15,1-6; 17,5-10; 19,10-14; Salmo
79/809-16), isto é, "esperava a justiça, mas o que apareceu foram gritos
de desespero" (Isaias 5,7). Ao indicar a si mesmo como verdadeira vinha
(versículo 1), talvez Cristo tenha tido a intenção de substituir-se ao povo
antigo para proporcionar, enfim, a seu Pai, o bom vinho da fidelidade.
Mas esta explicação não esgota o
símbolo da vinha em João 15. Com certeza, Cristo se serve dessa comparação para
destacar, como no Eclesiástico 24,17-20, a comunicação da vida divina.
Teríamos, assim, uma imagem da vinha da vida paralela à do pão da vida (João
6), e o tema da vinha seria, então, discretamente eucarístico. Aliás,
encontramos em João 15 os mesmos temas que em João 6: a idéia de
"permanecer em mim" (João 6,56; João 15,5).
Toda a fidelidade que Deus esperava do
povo eleito, encontra agora em Jesus Cristo, a verdadeira vinha. Nasce uma Nova
Aliança, porque a fidelidade de Jesus, traduzindo-se na obediência até a Cruz,
não foi gerada pelos recursos das pessoas: é a fidelidade do Filho Eterno
colocada ao alcance das pessoas.
Jesus é de Deus, e Dele são
também os ramos da videira, os cristãos, enquanto pertencem a Jesus. Na segunda
aplicação, a idéia da poda ou purificação, o sujeito agente é o agricultor,
portanto, o Pai mesmo. Temos aqui uma visão própria de João: pela Palavra de
Jesus (v. 3), o Pai exerce a krisis, a separação entre o que é salvo e o que é
rejeitado (cf. João 3,18 ss.); 5,24 ss.; 8,50 ss.; 12,47 ss.). Porém, a imagem
é mais complexa. Não indica apenas a separação entre aqueles que crêem e os que
não crêem na Palavra. Diz ainda que os que crêem são podados pela Palavra. Duas
boas maneiras de explicar isto seja talvez a comparação com o adolescente, que
quer ser tudo e não consegue ser nada, até que se decide a "podar"
uma série de coisas da sua vida e assim, pondo limites a si mesmo realiza sua
personalidade. Outra questão interessante é uma lavoura de café. Se não
desbrotar no tempo certo (tirar os brotos) o lavrador não terá uma colheita
abundante. Seria comparado com a poda da lavoura de uva. Isto significa que o
cristão se realiza enquanto é podado pela Palavra de Cristo para uma conversão
contínua. Limitando sua existência dentro das coordenadas desenhadas pelo
mandamento de Cristo - mandamento do amor fraterno - ele se torna personalidade
cristã. Assim produz fruto.
A poda é um processo necessário e
importante para que se produzam bons frutos. É preciso fazer a poda, isto é,
limpar os galhos das impurezas, retirar-lhes o supérfluo que impede a brotação.
Essa imagem tão rica em simbolismo mostra que todos os cristãos também necessitam
sofrer um processo de poda, de limpeza, de retira de supérfluo para que a seiva
do amor de Cristo circule forte e livremente e manifeste-se em frutos
vigorosos.
A outra explicação considera a união de
vida entre a videira e os ramos. Agora, o agricultor não é mais considerado
porque a videira mesma é o centro da atenção. Por um jogo de palavras com a
preposição em, se pode dizer que os ramos ficam na videira e a videira (por sua
seiva) nos ramos. Isto significa que sem a ligação com a pessoa de Jesus Cristo
não se pode fazer nada no que se refere à salvação. Analisando sem os olhos da
fé, parece fanatismo. A mensagem que está atrás desta insistência exclusivista
é a rejeição de Jesus como Messias por parte do judaísmo e a atitude dos
gnósticos, que só se interessavam nos belos pensamentos de Jesus, mas o querem
tornar supérfluo como pessoa histórica, principalmente como homem realmente
humano e sofredor. Contra estas tendências, João diz: sem Cristo, não há fruto
de salvação. O fruto será em primeiro lugar a conversão, a fé.
Um detalhe interessante é o uso
do verbo "permanecer", que á a palavra-chave deste texto (do
versículo 4 ao versículo 8, aparece sete vezes).Expressa a confirmação ou
renovação de uma atitude antes assumida. Supõe que o discípulo e a discípula já
tenham, anteriormente, aderidos a Jesus Cristo e que essa adesão adquira,
agora, estatuto de solidez, de estabilidade, de constância, de continuidade. É
um convite a que os discípulos mantenham a sua ligação com Jesus, a sua
identificação com Ele, a sua comunhão com Ele.
Função na liturgia
Se a leitura do Evangelho não oferece
uma ligação evidente com a primeira leitura dos Atos dos Apóstolos, tanto mais
evidente é a ligação com a segunda leitura, tirada da primeira carta de João e
expressando as idéias da observância do mandamento do Senhor, a recepção dos
nossos pedidos e o "permanecer em Deus". São as mesmas idéias de João
15,4-8. Formam, portanto, o eixo central da liturgia desse domingo. Além disto,
se deve observar que estamos no Tempo Pascal: a liturgia sensibiliza os fiéis
pela união da vida dos cristãos com o Cristo Ressuscitado, aliás, o único com o
qual podemos nos unir realmente. Sua ressurreição é condição para a nossa união
com Ele. Em outras palavras, não se propõe aqui uma imitação mecânica do Jesus
terrestre, mas, no reconhecimento que aquele que morreu na cruz foi
ressuscitado por Deus, Ele se torna uma presença fundamental para os cristãos e
sua Palavra o rumo de nossa vida, unindo-nos existencialmente com Ele e com o
Pai.
A vinha da Nova Aliança produz um fruto
abundante que se chama o amor: amor dos homens idêntico ao que o Pai tem para
com eles; amor "podado", pois teve que purificar-se do egoísmo; amor
que só pode ter êxito, participando do amor de Cristo. A Igreja é isso.
Na realidade do vinho da Eucaristia
encontramos ao mesmo tempo o amor de Deus que tanto amou as pessoas que lhes
deu seu Filho, e a fidelidade humana de Jesus "podada" de todo
egoísmo.
Da Palavra celebrada
ao cotidiano da vida
O temporal passou... saímos à rua...
nos deparamos com um triste cenário: galhos e mais galhos quebrados, jogados ao
chão. Já não podem mais cumprir seu papel vital de oferecer sombra, de
florescer, de dar frutos. Ali, esparramados pelas calçadas e ruas, ficam
aguardando que alguém os recolha, que os leve como entulho.Esses galhos não
mais viverão, pois foram afastados da árvore que lhes oferecia a vida. Em um
lindo dia de sol, no entanto... saímos à rua... nos deparamos com funcionários
da prefeitura podando as árvores da praça, vemos a dona de casa que poda
as árvores de seu jardim. Esse procedimento é essencial para as plantas, para
que a vida nelas se renove e com maior beleza e vigor nasçam novas folhas,
novos frutos.
Nós também e nossas comunidades
precisamos de momentos de poda, de limpeza, de purificação, que nos propiciem a
renovação da vida espiritual, que liberem o caminho para a seiva de amor que
nos sustentem. Tal ocasião ocorre, de maneira privilegiada, na Páscoa semanal,
celebrada a cada domingo, dia do Senhor. Na celebração eucarística, a Páscoa de
Cristo realiza-se em nós e nossa Páscoa se realiza em Cristo, pois Cristo
entregou-se ao Pai por nós e nós, com Cristo, nos oferecemos ao Pai.
Na continuação do capítulo 15 de são
João, cujo início lemos hoje, Cristo explicita: "Este é o meu mandamento,
amai-vos uns aos outros como eu vos amei". A seiva que perpassa os ramos
distribuindo-lhes vida é o amor, ela nutre a vida do cristão. Enquanto ela
continuar a atingir os ramos, estes continuarão a produzir e a multiplicar a
presença de Deus entre os seres humanos. Assim, enquanto permanecemos unidos a
Cristo, continuamos a receber a seiva do amor e, ao receber essa fonte de vida,
podemos frutificá-la, isto é, pelo fruto de nossos bons atos, levá-la às outras
pessoas.
Para que as pessoas melhor
compreendessem quem Ele era, Cristo recorria a figuras do cotidiano, por isso
atribui-se diferentes imagens: caminho, luz, videira. No Evangelho deste
domingo, Ele retoma a imagem da videira: "Eu sou a videira, vocês os
ramos". Utilizando-se dessa comparação, Ele apresenta um forte desafio:
"Fiquem unidos a mim e eu ficarei unido a vocês". Tal desafio é
proposto, hoje, a cada um de nós. Queremos, efetivamente, ser ramos unidos à
videira? Que temos a fazer para não sermos cortados como ramos imprestáveis? A
resposta, apresentada por São João nos capítulos 13 a 14, vem-nos do próprio
Cristo: fazer o que Ele fez. Isso significa cumprir seus mandamentos, o maior
dos quais explicita: "amai-vos uns aos outros". A essência do
Evangelho de hoje nos remete, portanto, à questão de como estamos amando nosso
próximo no cotidiano de nossas vidas. O apóstolo João adverte-nos: "Não
amemos só com palavras e de boca, mas com ações e de verdade!". Mas
cuidado! Não façamos confusão entre amar com ações e ativismo. Ações, aqui,
adquirem o significado de construir o Reino de Deus, que se realiza pelo fazer
e também pelo contemplar, duas dimensões complementares.
Como ramos produtores de bons
frutos, possamos ajudar que a Igreja de Cristo realize, hoje, o que realizava
nos primeiros tempos: "Consolidava-se e progredia no temor do Senhor e
crescia em número com a ajuda do Espírito Santo".
A Palavra se faz
celebração
Toda metáfora guarda os seus limites,
também a metáfora Fo Evangelho não detalha toda a nossa relação com Deus. É
preciso pensar que, ao nos ligarmos com Cristo, estaremos também ligados aos
demais ramos dessa videira., isto é, os irmãos e irmãs. Entretanto, nem sempre
as relações na comunidade são lineares e fluem como deveriam. Os ramos, em
contínuo cuidado (recebendo a seiva e as podas...), ainda que ligados a Cristo,
estão em processo de crescimento, amadurecimento e produção de folhas e frutos.
Entrar na comunhão com a videira significa admitir o ritmo alheio, reconhecer
falhas (pessoais, dois irmãos e do grupo) e desejar permanecer unidos nesse
corpo que, mesmo com fragilidades e contradições, continua ligado ao Senhor.
Entrar na comunhão dos ramos significa também desejar incluir os que estão de
fora e entender que são diferentes os níveis de participação. Muitas vezes
temos dificuldade de acolher o "diferente".
Alguns são muito de dentro, pois no seu
processo amadurecem assim. Outros, não tão de dentro, amadureceram de outra
forma que não aquela costumeira. A Videira que é Cristo tem para esses ramos outros
alcances que nem conseguimos ver... Nem todo mundo precisa ser de dentro da
Igreja (pastorais, coordenação e grupos). A extensão da Videira exige que
tenhamos irmãos e irmãs nos hospitais, nas escolas, na política, na cultura,
nas ONGS e no mundo do trabalho. Lá também se alastram e frutificam os ramos da
única Videira que é Cristo. Importa que sempre encontrem, na comunidade, um
porto onde ancorar, um "lugar" para nutrir sua fé e sua missão.
Ligando a Palavra com
a ação eucarística
A comunidade cristã é o lugar
privilegiado para o encontro com Cristo, "a verdadeira videira", da
qual somos os "ramos". É no âmbito da comunidade que celebramos e
experimentamos - no batismo, na eucaristia, na reconciliação - a vida nova que
brota de Cristo. A comunidade cristã é o corpo de Cristo e um membro amputado
do corpo é um membro condenado à morte... Por vezes, a comunidade crista, com
as suas misérias, fragilidades e incompreensões, decepciona-nos e magoa-nos;
sentimos que a comunidade segue por caminhos nos quais não nos revemos...
Surge, então, a tentação de nos afastar, de vivermos a nossa relação com Cristo
à margem da comunidade cristã. Contudo, não é possível continuar unido a Cristo
e receber a vida de Cristo, em ruptura com os nossos irmãos e irmãs na fé.
A cada domingo, nos reunimos em
assembléia pra celebrar, com alegria, a Páscoa do Senhor, e com maior júbilo o
fazemos neste solene Tempo Pascal.
Hoje, conforme expressa o oração do
dia, queremos pedir a Deus, Pai de bondade, que nos conceda a sua herança
eterna e nos conduza à verdadeira liberdade. Ao orar sobre as oferendas, o
padre, em nome da assembléia, completa esse pedido e solicita que o Pai conceda
"que sejamos fiéis por toda a vida". Na oração após a comunhão,
completamos nossos pedidos, requerendo que Deus permaneça entre nós e que, por
sua bondade, possamos passar "da antiga à nova vida", à vida de
plenitude que Cristo nos garantiu ao destruir a morte por seu sacrifício na
Cruz.
Neste domingo, portanto, nossas orações
seguem uma linha de súplica, de petição. Pedimos a liberdade, a herança, ser
fiéis, passar para a nova vida com a intenção de sermos um ramo que permanece
unido à videira e, assim, de muito fruto.
Possamos, nesta celebração do
mistério pascal, renovar nossa ligação com Cristo e a seus mandamentos e
expressar, por nossas preces, "sim, eu quero ser ramo que permanece unido
e purificado pelo Pai, dar muitos frutos".
padre Benedito
Mazeti
1 – Prestemos atenção
à força e luminosidade das palavras de Jesus no Evangelho deste domingo:
“Eu sou a verdadeira
vide e meu Pai é o agricultor… Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se
não permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em Mim. Eu
sou a videira, vós sois os ramos. Se alguém permanece em Mim e Eu nele, esse dá
muito fruto, porque sem Mim nada podeis fazer... Se permanecerdes em Mim e as
minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes e ser-vos-á
concedido. A glória de meu Pai é que deis muito fruto. Então vos tornareis meus
discípulos”.
No domingo passado,
Jesus apresentava-Se como o Bom Pastor, Aquele que cuida de todo o rebanho e
conhece cada ovelha pelo seu nome, Aquele que dá a vida, por opção livre,
testemunhando na Sua carne, com toda a Sua vida, o amor de Deus. Esse é o Seu
alimento. Há de ser também o nosso. Alimentar-nos de Deus, da Sua Palavra, da
Sua presença, do Seu Espírito de Amor. Só em comunhão estreita com Ele daremos
fruto em abundância.
Hoje Jesus utiliza
uma imagem igualmente feliz e expressiva. Ele é a videira, nós os ramos. Os ramos
– todos os discípulos – só produzirão fruto se ligados à vide. Se cortados, ou
“desligados” da videira, se não lhes chegar o “alimento” que percorre a cepa,
os ramos secam, serão cortados, servirão para queimar. O fruto produzido atesta
a ligação. A fé é o ponto de partida, o sustento e a chegada; são as obras,
contudo, que mostram até que ponto a “ligação” a Deus é efetiva.
As palavras de Jesus
convocam-nos para uma vida comprometida com os outros, neste tempo e no lugar
em que nos encontramos. Dar fruto para verificar a fé. Dar muito fruto para ser
mais forte a nossa ligação a Deus e a nossa comunhão com os outros. Dar fruto
para fortalecermos a nossa filiação divina.
2 – As missivas dos
apóstolos, às primeiras comunidades cristãs, têm a preocupação de avivar a fé e
a pertença a Cristo, como cabeça da Igreja, o estreito seguimento do Mestre e
do Seu jeito de viver e de amar. Neste sentido, a urgência de transformar a fé
em obras concretas de amor, de serviço e de partilha. Os ramos bem unidos à
videira darão frutos em abundância!
A fé desligada da
vida, da história e do tempo, seria artificial, vazia, condenada ao fracasso. A
fé em Jesus Cristo conduz-nos aos outros, ao mundo, à transformação das
realidades temporais, envolve-nos na promoção do bem, na prática das obras de
misericórdia (corporais e espirituais), expressão da caridade que é o próprio
Deus.
Diz-nos são João, na
sua primeira carta: “Não amemos com palavras e com a língua, mas com obras e em
verdade… É este o seu mandamento: acreditar no nome de seu Filho, Jesus Cristo,
e amar-nos uns aos outros, como Ele nos mandou. Quem observa os seus
mandamentos permanece em Deus e Deus nele”.
Por mais argumentos
que tenhamos sobre a fé que possuímos, esta é verificável pela nossa vida.
Amemos com obras e em verdade, não apenas com palavras. Estas têm valor e
espaço quando confortam, abençoam, acolhem, protegem, interpelam, como
expressão da caridade. É contraproducente pregar a estômagos vazios. As
palavras não excluem o serviço, promovem-no; não impedem a caridade,
incentivam-na. O mandamento é acreditar em Jesus Cristo como filho de Deus, a
fé, e amar-nos uns aos outros, a caridade. É a nossa ligação a Deus que põe em
evidência e fortalece a nossa ligação aos outros. O alimento de Jesus é fazer a
vontade de Deus. Para isso Ele vai ao encontro de todos, mas sobretudo dos que
têm mais necessidade de cura, de atenção, de acolhimento, do pão e da paz.
3 – A vivência da fé
engloba duas dimensões que se completam, a pessoal e a comunitária. Com efeito,
cada pessoa, única e irrepetível, acolhe a fé “à sua maneira”. Não conta apenas
o conteúdo, também o recipiente, e nem todos são iguais. Mas a fé é cristã, é
referida a Cristo, é a fé de Cristo, a fé do Corpo de Cristo que é a Igreja.
Nós somos membros, somos os ramos da videira, só produzimos fruto de qualidade
e abundante se estivermos ligados à verdadeira vide. A fé sem obras é morta. A
fé desligada da comunidade crente é uma contradição, uma farsa. A fé (como a
religião) liga-nos a Deus e aos outros.
A primeira leitura
dá-nos conta do percurso de são Paulo, da conversão até à comunidade-mãe,
Jerusalém, e como procura integrar-se antes de qualquer outra missão. Barnabé,
por sua vez, torna-se seu padrinho, garantindo aos apóstolos que Saulo/Paulo
não é uma ameaça mas um apóstolo entusiasta de Jesus.
“Saulo chegou a
Jerusalém e procurava juntar-se aos discípulos. Mas todos o temiam, por não
acreditarem que fosse discípulo. Então, Barnabé tomou-o consigo, levou-o aos
Apóstolos e contou-lhes como Saulo, no caminho, tinha visto o Senhor, que lhe
tinha falado, e como em Damasco tinha pregado com firmeza em nome de Jesus”.
Numa altura em que a
Igreja goza de paz e é benquista por todos, Paulo dá testemunho de Jesus Cristo
e da forma como se “converteu”. No entanto, bem cedo Paulo começa a ser
perseguido pelos helenistas que querem dar-lhe a morte. A comunidade protege-o
e envia-o em nova missão, para outras comunidades cristãs.
Movidos e inspirados
pelo Espírito Santo, procuremos que a nossa fé se aprofunde na prática da caridade
e inserida na comunidade paroquial. Ramos que se ligam à videira. Cristãos
unidos a Cristo. Fé projetada e comprometida com a vida e com os outros.
padre Manuel Gonçalves
Eu sou a videira,
vós os sarmentos
1ª leitura: Atos dos
Apóstolos 9, 26-31
O perseguidor é
perseguido
1. A primeira leitura apresenta-nos
Paulo que, depois da sua conversão, volta a Jerusalém. Sabemos, pelo próprio
Paulo (Gál1,16-24) que se deu nos três anos seguintes a uma estada na Arábia
(para onde se retirou para repensar a sua vida) e o seu ministério em Damasco
onde tinha tido lugar a sua conversão. Mas Lucas está muito interessado em
estabelecer rápida comunicação entre Paulo e os Apóstolos (assumindo Barnabé a
condição de anfitrião) para mostrar a comunhão de todos na pregação do
Evangelho. Lucas está a preparar as coisas para, a pouco e pouco, deixar Paulo
como protagonista dos Atos, como aquele que há-de levar o Evangelho até aos
confins da terra. O relato dos Atos, como o que há-de levar o Evangelho até aos
confins do mundo. A narrativa de Lucas deixa muitas pontas soltas, do ponto de
vista histórico. Paulo – que veio a Jerusalém para "ver" Pedro,
segundo nos confessa o próprio no referido texto dos Gálatas – teve a
oportunidade de verificar que os judeo-cristãos não se fiam nele. Os judeus
helenistas, como sucedeu com Estevão, provocaram uma altercação que poderia
ter-lhe custado a vida. Por isso o encaminharam para Tarso, para a assembléia
apostólica (At. 15). Lucas insiste muito, talvez demasiado, na comunhão de Paulo
com os de Jerusalém.
2. No texto de hoje é importante
salientar que Paulo, o perseguidor, teve no caminho uma experiência do Senhor
Ressuscitado, tal como tiveram os apóstolos e outros e está na disposição de
anunciar a Ressurreição, inclusive na mesma sinagoga onde foi responsável pela
acusação de Estevão. É este aspecto que interessa sobretudo a Lucas: se Estevão
foi abandonado no meio pelos interesses "religiosos" dos
responsáveis, Deus chama outro (nada menos do que o anterior inimigo do
Evangelho), Saulo, para anunciar a Ressurreição e levar a mensagem a todos os
homens. A Igreja, os discípulos não tinham, no entanto, ainda recebido o nome
de cristãos, como sucederá em Antioquia. Será na perseguição e no sofrimento
que eles se vão fortalecer. Mas a mensagem da vida, como coração do anúncio da
Ressurreição, há-de transformar o mundo.
2ª leitura: 10 de
João 3,18-24
O amor aos irmãos,
critério de consciência
1. A segunda leitura fala-nos da praxis
do amor e da verdade. A vida cristã não pode ser resolvida pela ideologia que
se mantém na cabeça, mas sim o que se vive com o coração. Para a Bíblia, o
coração é a sede de todas as coisas, do pensamento, e da ação, e é o coração
que nos julga, o que diz se o nosso cristianismo é verdadeiro ou pura ideologia.
É a sede da consciência e não podemos enganar-nos A verdadeira religião começa
como sendo uma questão de fé, mas, na praxis, mostra-se uma vida em que se crê
e deve levar a cabo; de contrário, não haveria fiabilidade.
Evangelho: João
15,1-8
Cristo videira donde
emana a vida.
1. O Evangelho de João oferece-nos um
desses discursos chamados de "revelação", porque neles este
evangelista nos revela quem é o Senhor. É enumerado entre os famosos "Eu
Sou" do Evangelho de João (o Messias 4,26; o Pão da Vida 6,35.41.48.51; a
luz do mundo 8,12; 9,5; a porta das ovelhas 10,7.9; o Bom Pastor 10,11.14; o
Filho de Deus 10,36; a Ressurreição 11,25; O Senhor e o Mestre 13,13; o caminho
14,6; a Verdade 14,16; A Vida 11,25; 14,6; o Rei dos Judeus 19,21. Assim foi
construída, de algum modo, uma "cristologia" e um grupo de discípulos
em exclusividade. Aqui, neste discurso, Jesus apresenta-se com uma imagem que
era tradicional na Bíblia, a da vinha. Conhecemos um canto da vinha no profeta
Isaías (c. 5) que contém umas constantes muito peculiares: a vinha era o povo
de Deus. Sabemos que a vinha é composta de muitas cepas, mas a vinha não deu
bom fruto, é um fracasso, deve ser arrancada. É este o canto de Isaías. Irá
Deus arrancá-la? Devemos dizer que desde a teologia joânica, a resposta a esse
canto é diferente; não é necessário que Deus a arranque: agora Jesus vai
apresentar-Se como a chave que cura para que a vinha produza bons frutos. Ele
apresenta-Se como a vide, e todos os homens como os sarmentos para que seja
possível dar bons frutos.
2 Mas, escutando a sua
"Palavra", os sarmentos terão seiva nova, vida nova e então levarão a
cabo as obras do amor. Porque não podemos permanecer fora d'Ele, da sua
Palavra, dos seus mandamentos, Respira-se, portanto, uma grande segurança face ao
ato de cercear e arrasar. Jesus está convencido de que permanecer n'Ele é uma
garantia para dar frutos. O "permanecer" n'Ele, o viver da sua
palavra, dos seus mandamentos, da sua luz, da sua vida fará com que a vinha, o
povo de Deus volte a ser o povo da sua verdadeira aliança. Com isto se
complementa o ensino da epístola na qual se propõe aos discípulos.
3. A fórmula "Permanecei em mim e
eu em vós", muito característica deste evangelista, define a relação do
discípulo com Jesus e é condição indispensável para dar fruto. A transformação
teológica que se opera a partir da imagem da vinha de Israel e esta proposta
simbólica do Evangelho de João é muito especial. Uma vinha é composta de muitas
cepas que, uma a uma, têm a sua vida própria e não têm comunicação entre si. No
caso da simbologia da vinha de João, a cepa, que é Jesus, faz com que os
sarmentos estejam unidos à cepa, a Jesus. Como Jesus é a vida e a luz e o
Filho, estão, por conseguinte, unidos a Ele. Estarem unidos a Ele é ter Vida.
4. Estaremos perante um conjunto de
discípulos ou de uma comunidade intimista, como alguns defenderam? Não podemos
negar que o Evangelho de João é deste teor. Seguir Jesus não se expressa da
mesma maneira, como, por exemplo, em Lucas, para quem é segui-l'O "pelo
caminho" Os discursos e as fórmulas de revelação do "Eu Sou"
desta teologia joânica não deixam outra opção. É bem verdade que tal não
significa que "exclusividade" de Jesus, o Filho de Deus, não permita
que essa luz de Jesus e essa vida que Ele trouxe, precisamente, se converta num
círculo de discípulos elitistas ou excludentes. A luz e a vida que Jesus trouxe
têm muitas formas de se manifestarem e de se tornarem presentes. Mas não se
trata, de forma alguma, de exclusivismo, antes de confiança; a confiança de que
em Jesus e com Jesus, o Senhor, encontraremos a vida verdadeira.
fray Miguel de
Burgos Núñez
tradução de Maria
Madalena Carneiro